As feiras-livres tem algo mágico. As pessoas se encontram, conversam. O ambiente é amigável e prazeroso. No último sábado do mês passado fui à feira do bairro São Pedro, em Juiz de Fora – MG, minha cidade. Tive o prazer de ver como ela cresceu em 25 anos. Ela foi criada para atender pedidos dos moradores daquele bairro, quando eu era secretário de Agropecuária e Abastecimento do município. E vi muita variedade e cores. Mas, nem sempre foi assim. Nos anos 70, nossas quitandas eram feias. Só tinha abóbora, alface, couve, chuchu, mandioca, inhame, batata, banana e fruta da época. Produzíamos comida pouca. Éramos importadores de alimentos com os escassos dólares que não tínhamos. Vivíamos à base de empréstimos internacionais.
     Mas, evoluímos rapidamente e não me canso de ouvir os Titãs cantarem que “a gente não quer só comida, quer diversão e arte, quer dinheiro e felicidade...” Vixe! Quando comer não é mais o principal objetivo da vida, fica claro que superamos esta barreira da escassez de alimentos. A incerteza se teremos o pão nosso de cada ficou para traz. Em apenas 45 anos, de importador de alimentos, passamos a alimentar 210 milhões de brasileiros e mais 4,5 brasis mundo afora. Em 2017, exportamos alimentos para 140 países e, entre o que gastamos e arrecadamos em dólares, deixamos no Banco Central US$ 81,7 bilhões, que são usados para pagar desde a Coca-Cola que você bebe até o Netflix que você assiste. Afinal, tudo isso é pago em dólar. Foi a tropicalização de plantas e animais que não existia no Brasil, como soja, milho, capins, bois e vacas que permitiu esta conquista. O Brasil é o único país do mundo que faz agricultura diversificada na região tropical. E isso é fruto de tecnologia que foi gerada aqui, disponível para o mais empreendedor dos brasileiros, que é o produtor rural.
     Na última semana de abril a Embrapa completou 45 anos. Em vez de deitar sobre as conquistas do passado, reconhecida mundialmente como o motor tecnológico da transformação brasileira, lançou o documento Visão 2030 – O futuro da agricultura brasileira, acessível em https://www.embrapa.br/visao-2030 . O documento é fruto da visão de mais de 300 profissionais de várias instituições, não somente da Embrapa. Ali estão delineadas algumas tendências para o futuro próximo. Afinal, não é conversa de mineiro, 2030 é logo ali. Vamos ter cada vez mais mão-de-obra escassa e cara no campo, com poucos e grandes nos elos da cadeia produtiva. Serão menos produtores, produzindo grandes quantidades. Serão menos empresas processadoras e o varejo, que já é concentrado no Brasil, será ainda mais. Com recursos escassos, os processos produtivos terão de ser intensificados, ou seja, cada vez será necessário, para ser viável economicamente, obter maior produção por hectare. Perdas e desperdícios precisarão ser reduzidos, pois ainda estão altos.
     Apesar de Trump não acreditar, as mudanças climáticas já impactam a agricultura mundialmente e o Brasil também precisa se adaptar a esta nova realidade. Teremos de gerar plantas e animais resilientes, mais adaptados ao aquecimento global e às variações de temperatura. Também teremos de gerar novas ferramentas para mitigar três grandes riscos que estão presentes na atividade agrícola. Os riscos climáticos estarão mais intensos, os riscos de mercado, gerado pela maior volatilidade de preços e os riscos de gestão, já que a atividade agrícola exige que eficiência e reposicionamento contínuo.
     Num outro aspecto, precisaremos desenvolver competências para agregar mais valor às cadeias produtivas e o leite abre muitas possibilidades. Isso depende mais dos produtores e industriais, pois a inovação depende deles. Mas, a pesquisa pode atuar de modo decisivo. Por exemplo, no leite fica evidente que precisamos encontrar novos caminhos. É evidente que precisamos nos tornar exportadores, pois assim será possível conviver com preços internos mais estáveis. Ademais, o esforço de exportação aumenta a necessidade do setor ser mais eficiente, ter maior produtividade e gerar produtos de melhor qualidade. Mas, trabalhar a questão do valor em duas vertentes. Por um lado, é preciso é encontrar novos usos para o leite, de modo objetivo. Leite que não provocam alergia e leite que protege o coração são exemplos. Por outro lado, é preciso despertar o sentimento de experiências, como desperta os doces e queijos artesanais.
     Além de produzir alimentos seguros, saudáveis e rastreáveis, será preciso estar conectado com os anseios do consumidor, num cenário em que a biologia sintética, a bioinformática e o mundo digital serão decisivos para o sucesso da agricultura brasileira. A terra, as plantas e os animais continuarão a ser fonte de riqueza. Mas, cada vez mais fica evidente que o negócio agrícola vai depender as novas aplicações da ciência e este é um grande desafio, pois o Brasil parou de investir em ciência. Um risco, pois o sucesso até aqui alcançado não garante o futuro, que depende do que fizermos a partir de agora até 2030!
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