Entrevista com Duarte Vilela – Chefe geral da Embrapa Gado de Leite

Engenheiro-agrônomo pela Universidade Federal de Viçosa e doutor em Nutrição Animal pela mesma Universidade, Duarte Vilela dirige pela segunda vez a Embrapa Gado de Leite. Em seu primeiro mandato, a Empresa completou 25 anos. Agora, ele está à frente da instituição no momento em que se comemoram os 35 anos de sua fundação. Este também é o tempo de trabalho dedicado por ele à pesquisa agropecuária nacional, o que o credencia como uma das maiores autoridades nacionais no setor.

- O que mudou na pecuária de leite dos anos 70 até hoje?
A partir de 1976, quando foi criada a Embrapa Gado de Leite, houve uma grande evolução nos índices de produção e produtividade. A produção brasileira de leite aumentou quase 400% nos últimos 35 anos. Em números absolutos, o Brasil tinha 12 milhões de vacas produzindo oito bilhões de litros de leite há pouco mais de três décadas. Hoje, nossa produção caminha para atingir 30 bilhões de litros por ano com um rebanho de cerca de 15 milhões de vacas. Considerando-se as bacias leiteiras tradicionais e propriedades com rebanhos especializados, há registros de produtividade média anual de 3.600 litros vaca/lactação. Isto prova que o produtor brasileiro se tornou mais tecnificado.

- De que forma a Embrapa Gado de Leite contribuiu para a evolução da atividade nestes últimos 35 anos?
A Embrapa Gado de Leite, ao lado das empresas estaduais de pesquisa e universidades, teve um papel fundamental na melhoria do desempenho da atividade. Um exemplo é o processo de melhoramento genético do rebanho: o país é hoje referência mundial em genética zebuína tanto para leite quanto para carne. Saímos dos programas clássicos de melhoramento onde medíamos a produção diária e por lactação e hoje trabalhamos com genômica animal, identificando marcadores genéticos com importância econômica para a produção de leite. O melhoramento vegetal e as técnicas de alimentação dos animais também foram um fator importante. Até o início dos anos 80, a base das forrageiras era o capim-gordura e o capim provisório. Hoje, têm-se o pastejo rotacionado do capim-elefante e de forrageiras de elevado valor nutritivo como as gramíneas do gênero Cynodon, Brachiaria e Panico, assim como leguminosas (alfafa), além do uso de alternativa para o período de escassez de forrageiras (cana de açúcar com ureia e silagens). Estas foram tecnologias muito divulgadas pela Embrapa Gado de Leite que garantiram resultados excelentes na produção e produtividade de leite a pasto. Naturalmente que também ocorreu aumento nas áreas de pastagens cultivadas no Brasil, o que gerou aumento na produção, mas o aumento da produtividade está plenamente relacionado às novas tecnologias desenvolvidas ou adaptadas pela pesquisa nacional.

- Qual a expectativa para a pesquisa em bovinocultura de leite para os próximos anos?
Buscamos a fronteira do conhecimento. Na pesquisa básica pode estar a resposta para muitas das questões que hoje preocupam a cadeia produtiva do leite. A biotecnologia já mostrou que, por meio de marcadores genéticos, clonagem e transgenia, é possível acelerar o processo de melhoramento dos bovinos, criando populações resistentes a endo e ectoparasitos, à mastite, ao estresse térmico etc. A pesquisa básica, de ponta, trará resultados com mediana rapidez para os produtores e a população em geral. A infinidade de soluções que a biotecnologia apresenta é impressionante e vai do melhoramento genético ao desenvolvimento de produtos com qualidades nutracêuticas. A Embrapa Gado de Leite está alinhada com as questões das ciências avançadas e o nosso portfólio de pesquisas foi construído para atender às expectativas do agronegócio do leite no Brasil e nos países de clima tropical.
 
- E como os produtores têm acesso a estas pesquisas?
Tão importante quanto gerar novas tecnologias é fazê-las chegar ao produtor. Para que isto ocorra com eficiência, a Embrapa se reorganizou internamente. Foi criada uma Chefia adjunta de Transferência de Tecnologia, com ações exclusivas para esta finalidade. Entre as unidades da Embrapa, a Embrapa Gado de Leite é reconhecida por suas ações de capacitação de produtores. Possuímos núcleos avançados em todas as Regiões do país para identificar as demandas locais e darmos respostas seguras com rapidez. Buscamos parcerias com outras instituições para fazer chegar aos produtores de todo o Brasil informações técnicas de qualidade. Como exemplo, iremos lançar oficialmente este ano o PAS-Leite (Programa Alimento Seguro voltado para a cadeia produtiva do leite). Esta é uma ação em parceria com o Sebrae, Senar, Senai e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. O Sebrae, por meio do SebraeTec, disponibilizará consultoria a preços subsidiados para os produtores interessados em trabalhar segundo as Boas Práticas Agropecuárias. Enfim, edificar caminhos sólidos para a pesquisa da Embrapa Gado de Leite é um grande desafio, mas temos a certeza de poder contar com a parceria de instituições sérias do setor. Sabemos que o leite é um produto imprescindível para a humanidade. Por meio da pesquisa ou da transferência de tecnologia, não mediremos esforços para transformar o Brasil num grande produtor e exportador de lácteos.
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Comentários

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    Caro professor Muhlbach,

    Inicialmente agradeço sua contestação, muito oportuna e importante. A Embrapa Gado de Leite ao completar 35 anos de pesquisas voltadas para o setor produtivo leiteiro nacional, naturalmente gerou mais tecnologias do que as de capim-elefante e cana com uréia. 

    Temos há 10 anos, aproximadamente, um Núcleo avançado de pesquisa e de TT na região Sul, hoje em Curitiba, no Paraná e com extensão em Pelotas, RS, que apóiam nossas ações de pesquisa e principalmente as de TT. Desenvolvemos no RS variedades de azevem, com destaque para a Ponteio, além de já termos trabalhos com aveia e alfafa, com gramíneas do gênero Cynodon, Panicum e Brachiaria, avaliadas sob pastejo com vacas Holandesas com potencial de 6 a 7 mil kg por lactação. Temos pesquisas de melhoramento genético animal e agora em genômica, que são apropriadas por todos os produtores, independentemente da região do país, não deixando de citar que o Girolando já se estabeleceu por lá e uma das primeiras importações de Gir da Índia se deu pelo Sul, no Paraná, pelo memorável criador Celso Garcia Cid. Temos o Kit ordenha muito utilizado em pequenas propriedades leiteiras e que muito seria útil no Sul, principalmente no RS e SC, pelas características das propriedades leiteiras, na grande maioria pequenas propriedades. Temos a nanotecnologia aplicada ao controle de mastite, entre outras.

    Em nosso campo experimental localizado em Coronel Pacheco, MG, tem-se um  sistema de produção de leite em confinamento para gado Holandês há mais de 20 anos, que geram informações para pesquisa e TT.

    Em termos de futuro, trabalhamos com nutrição animal, onde desenvolvemos a primeira tabela de requerimento nutricional de gado de leite em condições brasileiras, com avaliações de exigências nas diferentes raças leiteiras. Pesquisamos tratamentos de resíduos da atividade leiteira, tratamento de carcaças de animais mortos, mitigação de gases de efeito estufa, integração lavoura, pecuária e floresta, e muito mais. Caso o nobre professor tenha interesse em nos visitar para aprofundar no que fizemos e estamos fazendo para o País, muito nos honraria, ou se não, visitando nosso site WWW.cnpgl.embrapa.br .

    Grande abraço e muito obrigado pela oportunidade.

    Duarte Vilela   

  • É incontestável, a Embrapa Gado de Leite é referência de excelência em pesquisa do setor... para o Brasil Tropical. Todavia,  essas tecnologias (capim-elefante, cana com uréia e gado azebuado) não servem para a Região Sul, que também produz leite, e para a qual foram muito mais significativas as mudanças disseminadas pelos produtores da região de Castro, PR. Resta saber quais serão as tecnologias que as entidades referidas ensejarão transferir para os produtores da Região Sul.
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